198 - Protegemos mesmo as crianças?
Só de passagem irei referir a disciplina de Cidadania, ainda não pude ler o texto que está para consulta pública, ficará, pois, para daqui a umas semanas uma vez que tenho bastante a dizer sobre o assunto. E menciono-a aqui porque passei a semana a ouvir psicólogos e similares muito preocupados com as péssimas consequências para as criancinhas da redução na educação sexual! Pelos vistos até vai fazer disparar o número de doenças sexualmente transmitidas na camada mais jovem...
Em posts anteriores deste blogue já falei do modo como tendemos, por um lado, a meter crianças e jovens numa redoma para os “proteger”, deixando-os totalmente incapazes de enfrentar a menor contrariedade ou infortúnio que lhes venha a acontecer mais tarde ou mais cedo e, também do modo como só saímos em sua defesa em situações que encaixam numa certa visão que uma certa esquerda tem do mundo.
Nomeadamente, Deixem os bullies em paz (em que refiro que devíamos era fortalecer as vítimas para deixarem de o ser porque haverá sempre um bully à sua espera), Partam-se os vidrinhos (em que refiro, precisamente, a redoma em que criamos crianças e jovens), Jovens (em que falo do facto de chegarem a adultos sem nada terem feito na vida, por vezes nem mesmo estudar, exceto exigir isto e aquilo), A infância é mesmo para brincar? (em que falo da evolução do conceito de brincadeira e do facto de a conceção atual de ocupação dos tempos livres não deixar dar azo à imaginação), A geração entediada (o título diz tudo), Pobres jovens! (em que falo da ideologia de género e do facto de não estenderam o conceito de “o jovem é que escolhe” a outras áreas), Os jovens são infelizes (ou antes, são levados a sentirem-se infelizes) e Indisciplina e violência na escola (sim, são ambas graves e só a segunda é alvo de atenções e, mesmo assim, só com a combinação “certa” de atores.
Quem leu todos estes posts deve ter notado que o fio condutor se resume a isto: com as melhores intenções do mundo, estamos a criar jovens que se vão abaixo à menor contrariedade, que chegam à idade adulta sem nada terem feito para além da escola – e mesmo esta... – e sem uma verdadeira noção de como é o mundo real, pior ainda, que passaram a vida em atividades estruturadas ou, caso estas não existam, totalmente à deriva sem saberem como ocupar-se.
Mas neste post quero referir o facto de que, com tanta conversa sobre proteger as crianças de tudo e mais alguma coisa, a triste realidade é que não o fazemos quando elas mais precisam.
Comecemos pela pedofilia, que só recentemente começou a ser vista como a praga que é e que só é veementemente condenada em certas circunstâncias. Mas, o que fazemos para proteger as crianças de se tornarem vítimas? Porque não lhes ensinamos, desde a mais tenra idade, o que é aceitável ou não em termos de toques e contactos entre um adulto, seja ele qual for, e elas? Mais importante ainda, porque não criamos modos simples e rápidos de atender possíveis queixas e, sobretudo, porque não educamos professores e auxiliares escolares a detetarem sinais que possam indicar estarem perante uma vítima?
É que, lembro, a maior parte dos criminosos são membros da própria família, amigos chegados desta ou, com cada vez mais frequência (pelo menos a fazer fé nas denúncias), professores, treinadores e similares. O que não pode de modo algum acontecer são casos como o que vi recentemente em que, após ter cumprido uma pena ridícula pelo abuso sexual da filha da sua companheira, de 11 anos, o macho em questão voltou a residir com elas!
Outra vertente muito popular quando se fala em proteger crianças e jovens está em evitar, por todos os meios, que tenham contacto com ideias consideradas perniciosas – é claro que se essa tentativa vier do lado “errado”, digamos, é censura! Ora o que devíamos realmente fazer era expor os mais novos a todo o tipo de ideias, explicando, de um modo adequado à sua idade, as suas origens, consequências e ramificações. É que só lhes mostrar um dos lados não é proteção, é lavagem ao cérebro, sem contar que mais tarde, na adolescência, irão adotar todas essas ideias proibidas como modo de se rebelarem.
E já repararam que, embora se fale muito em ouvir as crianças, a realidade é bem diferente e raras vezes são realmente escutadas? Pior ainda, há inúmeros assuntos que não lhes são explicados porque “não são para a tua idade” – e não me refiro à educação sexual, tão badalada a propósito da Cidadania, há inúmeras questões que as crianças não põem ou deixam de o fazer porque são ignoradas ou lhes dizem que são um disparate.
Sim, o problema pode ser os próprios pais nunca terem pensado no assunto em questão, mas muitas vezes não explicam nem falam disso para “proteger a criança da crua realidade do mundo” – curiosamente, não veem problema no uso de certos jogos de computador ou programas televisivos suscetíveis de dessensibilizar até um adulto para violências de todo o tipo. Também há a possibilidade, bem real, de a pergunta levar para áreas consideradas anátema pelo adulto, sendo a sua única reação insultar quem pensa dessa maneira – e se estão a pensar em pessoas conservadores, bom, é bem mais provável este tipo de reação vir de esquerdistas que nem podem ouvir mencionar certos assuntos sem desatar logo a berrar fascista e similares.
Resumindo, talvez seja altura de pensarmos em proteger, de facto, crianças e jovens de ameaças externas – a pedofilia – mas, ao mesmo tempo, equipá-los com conhecimentos suficientemente amplos para poderem optar, sem pressões de fazer como os outros, por um comportamento decente.
Para a semana: Repensemos as ajudas Acho que está mais do que na altura de repensar o modo como gastamos balúrdios de dinheiro, cá dentro e lá fora, para, supostamente, ajudar os mais necessitados.
