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Luísa Opina

Neste blogue comentarei temas genéricos da nossa sociedade. Haverá um novo texto todas as sextas-feiras

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Luísa Opina

19
Abr24

132 - Haja consistência

Luísa

Um bom título alternativo para este post seria, “acabemos com o dois pesos e duas medidas”. Infelizmente, há cada vez menos pessoas razoavelmente isentas no que dizem e no que fazem. Não me refiro, claro está, ao chamado povo mas sim a quem ocupa posições de responsabilidade, seja na governação seja na formação da opinião pública. Bem sei que todos temos direito à nossa opinião, não é isso que está em causa, o perigo vem de as quererem passar por factos e, pior ainda, por notícias.

Não me incomoda, minimamente, ver certos debates em que os participantes estão devidamente identificados como associados a um partido ou tendência política – ou clube de futebol... Mas quando vemos notícias a serem distorcidas ao sabor da tendência de quem as lê (ou organiza), bom, aí está o caldo entornado.

O que se passa no Médio Oriente, por exemplo. Tantos apelos para que Israel pare com a violência e reconheça o estado da Palestina. Mas já viram alguém exigir ao Hamas que liberte imediatamente os reféns? Ou que deixe de usar hospitais e casas particulares como escudo para as suas operações militares? Mais ainda, a teoria de dois povos, dois estados só funciona se houver reciprocidade. Mas, estranhamente, não vemos ninguém – e muito menos a ONU – a exigir que os palestinianos reconheçam o estado de Israel.

Mudando de assunto, berra-se e barafusta-se contra a Arábia Saudita e o Qatar porque não respeitam os direitos das mulheres. Mas já viram alguma manifestação de solidariedade com as mulheres do Irão? Pois, é que este é um inimigo de Israel, por isso deixa-se passar as atrocidades que comete. Já agora, não é bizarro termos ouvido o Embaixador desse país dizer que a tripulação do navio português apreendido está livre e vermos hoje a notícia de que libertaram um membro feminino da tripulação? Alguém realçou este “pequeno detalhe”?

E temos também a reação pública, e não só, perante portugueses presos no estrangeiro. Há-os detidos há anos, sem culpa formada, nomeadamente em Angola e na África do Sul. Ouvimos falar neles? Há pressões para que os julguem ou libertem? É claro que não! Mas quando se trata dos dois pategos que acharam que era boa ideia fazer tráfico de droga na Indonésia, aí, sim, há esforços de todo o tipo.

Outra coisa que sempre me fez confusão tem a ver com o repatriamento de emergência de países africanos devido a guerras. Se o grupo inclui pessoas não portuguesas, temos a Cruz Vermelha e outras organizações em peso no aeroporto, prontas a fornecer todo o tipo de apoios e ajudas. Mas se são só portugueses... azar, estão por conta própria. Pelos vistos reina a teoria de que estes têm família e amigos prontos a ajudarem-nos, mais dinheiro para as primeiras despesas, sobretudo se não são de Lisboa. Só que... será mesmo assim?

Temos depois a reação atual ao que se passa com António Costa e o facto de haver ou não uma acusação. Chovem os pedidos de uma justiça célere e críticas ao Ministério Público. Curioso, quando Carmona se demitiu de Presidente da Câmara de Lisboa devido a uma investigação de fraude, a coisa arrastou-se que tempos, deu ampla oportunidade ao PS de reconquistar a dita Câmara e não houve nem críticas nem pedidos de celeridade. Pequeno detalhe, a investigação não deu em nada.

Continuando com o Ministério Público, soube hoje que pede prisão efetiva para Mário Machado por apelar à violação de mulheres de esquerda em mensagens que trocou com outra pessoa. Tudo bem, acho isso inaceitável. Mas... pois, há sempre um mas, porque não acusaram o inenarrável Mamadou quando, “citando um livro”, disse publicamente que devíamos matar todos os brancos? Não é discurso de ódio? Sem contar que tenho uma vaga ideia de ter ouvido algo similar à frase de Machado mas relativa às mulheres apoiantes do Chega...

O que nos leva à difamação. Ventura foi condenado por chamar banditagem a uma família em que mais de metade dos membros tinha cumprido penas ou aguardava julgamento. Mas a Ana Gomes chamar escroque a um empresário é apenas algo que se insere no direito à liberdade de expressão, apesar de ser ofensivo da honra. Hmm... E se alguém da dita direita chamar umas coisinhas a essa senhora, também é liberdade de expressão?

Temos, também, a criminalidade. Se um patego mata e fere a tiro algumas pessoas nos EUA, lá vêm os comentários sobre a necessidade do controle das armas, mesmo sem se darem ao trabalho de indagar se as do dito tinham sido compradas legalmente. Mas na última semana tivemos ataques à facada com as mesmas consequências nefastas e nada ouvimos sobre o seu controle...

Já agora, como o nosso é um país em que é quase impossível a um cidadão honesto conseguir licença de porte de arma, não é estranho não ouvirmos comentários sobre o assunto perante o enorme aumento de crimes com armas de fogo que se tem verificado nos últimos tempos?

Finalmente, a habitação. Não é curioso vermos sempre histórias de inquilinos que não têm dinheiro para pagar a renda e estão em vias de ser despejados mas nunca as dos muitos senhorios que vivem em dificuldades porque lhes devem os alugueres de meses ou, até, de anos? Ou as de pessoas que até têm meios mas não pagam porque sabem que vai demorar imenso tempo até serem corridos da casa que habitam de borla?

Perante tudo isto, só espero que as ideias da UE para pôr fim ao que chamam “fake news” (que é, claro, tudo o que possa desagradar ou ser inconveniente para os “bem-pensantes donos da verdade”) não venham piorar ainda mais as coisas. É que se já é difícil perceber o que realmente se passa no mundo, imaginem como será depois!

Para a semana: O 25 de Abril Passados 50 anos, que democracia e liberdade temos?

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