98 - Hipocrisias 2
Neste post irei um pouco “ao sabor da corrente”, mencionando casos diversos recentes que demonstram, na minha opinião, a mais acabada hipocrisia que vai grassando por estes lados.
Para começar, a petição para impedir de dar à nova ponte pedonal sobre o Rio Trancão o nome do Cardeal Dom Manuel Clemente por ser “ofensivo para com as vítimas dos abusos sexuais da Igreja”. Começo por dizer que não simpatizo, nem nunca simpatizei com este senhor, não estou, pois, a defender que se deva dar ou não dar o seu nome seja ao que for.
Mas analisemos um pouco o argumento do “pode ser ofensivo”. Quantas ruas Karl Marx existem país fora? A sua existência não ofende as muitas vítimas do comunismo de que, lembremos, ele é o pai? O mesmo se pode dizer das Ruas Lenine... E que me dizem do nome Otelo Saraiva de Carvalho? Face ao que esse senhor fez logo após o 25 de abril, não acham que haverá muitos ofendidos? Pior ainda, quem vive numa rua não tem outro remédio senão saber-lhe o nome, mesmo que o considere profundamente ofensivo. Mas... uma ponte? Quantos lhes sabem os nomes? Exceto as “grandes”, claro, como a 25 de Abril ou a da Arrábida, por exemplo.
E se o pessoal da “igualdade” se lembrar de estender a sua campanha à toponímia das nossas ruas, bom, estamos feitos ao bife. É que em Lisboa, por exemplo, das 1952 ruas com nomes de pessoas, só 207 são de mulheres!
Para finalizar este assunto, deixo-vos um pequeno exercício. Quando circularem pela vossa terra – ou consultarem um mapa – prestem atenção aos nomes de ruas e avenidas e vão tomando nota dos que “ofendem a vossa sensibilidade”. Bom, isto para já não falar de alguns nomes de ruelas ou zonas antigas... ou até de povoações.
Passemos agora à polémica do abate dos quase 2000 sobreiros em Sines por causa da construção de uma central eólica. A minha primeira estranheza é esta, os supostos ambientalistas deste país (e não só) querem, não, exigem que a muito curto prazo fiquemos apenas dependentes de energias renováveis, nomeadamente a eólica e a solar. Será que não lhes ocorre que, para instalarmos uma produção a sério, vai ser preciso destruir uma parte do que está nas zonas onde vão ser instaladas essas novas centrais? E lembro que são contra a sua instalação ao largo da nossa costa porque afeta o fundo marinho, os peixinhos, enfim, tudo.
Sim, um sobreiro demora 25 anos – e não 60, como corre por aí – até se poder extrair a primeira cortiça, podendo viver até aos 200 com descortiçamentos de 9 em 9 anos. Já agora, experiências recentes com irrigação destas árvores permite reduzir o período inicial para entre 8 e 10 anos.
Sendo assim, a plantação de novos sobreiros em substituição dos abatidos garante a continuação de cortiça de qualidade... Ou acham que os privados vão investir fortemente no plantio de novos exemplares nas suas pequenas propriedades?
Mas para mim a grande hipocrisia é esta: chora-se baba e ranho por estes sobreiros que, repito, vão dar lugar a outros noutra zona próxima, mas nada se disse quando a China, irritada com a resistência tibetana, mandou desflorestar os Himalaias naquela zona, afetando gravemente o comportamento das monções e provocando grandes cheias, nomeadamente no Bangladesh.
Mas tudo bem, “ambientalista” que se preze é de esquerda, perdão, de extrema esquerda, e nunca se lembraria de criticar nada que um dos seus países ídolos faça. Já agora, para evitar reações às aspas aqui usadas, para mim há dois tipos de ambientalistas: os que o são de facto, defendendo medidas com base em estudos e dados devidamente abalizados e criticando o que tem de ser criticado, sem olhar a quem o faz; e os das aspas, que o são só da boca para fora, vão ao sabor das últimas “modas” sem nunca se informarem devidamente e, acima de tudo, só criticam atos feitos por certas pessoas ou países.
Vamos agora aos artistas.
Começo com esse senhor Bordalo II, que se divertiu a vandalizar a placa indicadora do Campo Pequeno “como protesto contra as touradas”. Diz-se um ativista anticapitalismo mas, curiosamente, vende as suas esculturas a grandes empresas por valores que chegam aos 72 mil euros! Pois é, grande coerência. Usa, também, lixo como matéria-prima, como protesto contra o consumismo. Mas não faz mal criar esse mesmo lixo? E já agora, simples curiosidade, repôs a placa danificada? Foi multado? Ou por ser “artista” está acima da lei?
E que me dizem da petição, curiosamente patrocinada por uma galeria de arte de Lisboa, que pede a remoção imediata de esculturas instaladas na Praça do Município e em Belém? De acordo com a dita, as primeiras denotam “ignorância e insensibilidade, provincianismo e incompetência” e as segundas “literalidade, incompetência plástica e escultórica e a capacidade comum de afetarem negativamente o espaço público de enorme qualidade urbana.”
Não tenho opinião formada sobre estas peças, mas acho-as, francamente, bem melhores do que a do topo do Parque Eduardo VII, por exemplo, comprada a preço de ouro e que, muito francamente, foi (e é) bastante contestada.
Para mim, a grande questão é esta: os assinantes da petição são os donos do cânone artístico? Os ditadores do que é “bom” e estético? Ou será que o problema é outro, ou seja, os autores destas obras não pertencem ao seu grupinho? É que quando o são, é sempre uma aquisição mais do que válida e uma obra de grande mérito!
Para semana: Esquizofrenia Somos um país pioneiro nalgumas coisas e súper atrasados noutras
