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Luísa Opina

Neste blogue comentarei temas genéricos da nossa sociedade. Haverá um novo texto todas as sextas-feiras

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Luísa Opina

07
Out22

53 O público é que é bom!

Luísa

Numa altura em que se recomeça a falar em privatizar a TAP, em que os problemas dos hospitais públicos continuam e há inúmeros alunos do ensino público sem professores acho que é altura de falar da dicotomia entre público e privado.

Para a nossa esquerda, e não só, falar em setor privado é pior do que falar do diabo na Idade Média. Ouvindo-os, fica-nos a ideia de que a esmagadora maioria dos problemas que nos afligem se resolviam se passasse tudo para o setor público. Repare-se que evitam cuidadosamente o termo “nacionalizar”, mas a intenção básica é a mesma dos “belos tempos” do pós 25 de abril.

Tentam, também, vender-nos a ideia de que o país pouparia imenso dinheiro se todos os serviços fossem fornecidos exclusivamente pelo setor público.

Eu até entendo, muitos são, foram ou sonham ser políticos de profissão, ou seja, uma versão glorificada do funcionário público. E uma grande parte dos que assim falam pertencem – ou pertenceram – ao dito setor público.

E é aí que está o grande problema.

Ora vamos por partes, começando pelo Ensino. Sempre que há uma greve nesse setor – e são mais que muitas – lá vem a conversa da “qualidade do ensino”, de as crianças serem o futuro do país, etc. Mas, na prática, resume-se tudo à simples exigência de mais dinheiro e regalias e, acima de tudo, de eliminar o setor privado que esse, sim, funciona e bem.

Lembram-se das parcerias que alguns estabelecimentos tinham com o Estado, permitindo aos pais pagar apenas uma parte das propinas e permitindo, assim, a sua abertura a setores mais desfavorecidos? Pois, tanto fizeram que acabaram com a esmagadora maioria, mesmo quando a escola pública da zona era mesmo muito má – mas esta ficou aberta, claro, e a funcionar nos mesmos moldes!

Falar em cheque educação é, mais uma vez, como falar do diabo numa época em que este metia pavor a todos. O facto de que o sacrossanto Estado não gastaria mais com este sistema não os afeta. Nem o pequeno detalhe de que, assim, as escolas más teriam de fechar, fossem públicas ou privadas.

E já repararam que as escolas privadas nunca fecham só porque faltou alguém do pessoal auxiliar?

Não, a solução é sempre a mesma, só ensino público e turmas mais pequenas. E isto apesar de não ter funcionado a favor dos alunos nas célebres escolas primárias que fecharam por falta estudantes. Vi até um caso em que um rapazinho tinha já feito três anos da primária sozinho com a professora e, coitado, mal sabia expressar-se e denotava uma total falta de conhecimentos de tudo.

Mas o público é que é bom!

Passemos à saúde onde, mais uma vez, a intenção, declarada ou não, é ter um setor totalmente público. E porquê? Bom, pela saúde dos portugueses não é certamente. É que sempre que falam de falta de meios – leia-se, de pessoal – a impressão que fica é que esses meios só faltam porque não os gerem como deve ser.

Veja-se o caso dos partos, tão badalado – pelas razões erradas – nas últimas semanas.

Basicamente, pretende-se que esteja sempre de serviço uma equipa completa de especialistas. A sério? Quantos partos difíceis há por mês? Ou até por ano? Não seria um melhor aproveitamento de recursos ter médicos, digamos, normais, ou até internos a acompanharem a situação, chamando o especialista apenas caso a situação o justificasse? Assim já haveria meios para todos.

Veja-se o pânico gerado por um hospital, penso que o S. João do Porto, ter usado internos “contra as regras”. E se a grávida desse à luz na ambulância dos Bombeiros? Ou até no carro da família enquanto procurava um hospital que tivesse os meios “certos”? Era melhor?

Já agora, porque é que a triagem das Urgências não é feita por um interno? Com o apoio, claro, de um médico, caso se justificasse. Se não são capazes de o fazerem, o que é que aprenderam em tantos anos de estudo?

Mais ainda, porque não podemos escolher o nosso médico de família, seja do SNS ou não, pagando-lhe o Estado um valor previamente acordado por cada consulta? Este sistema existe, com grande êxito, em vários países, aliviando assim a sobrecarga do serviço público que fica mais virado para casos complicados e que exigem recursos não facilmente disponíveis no privado.

Mas falar em otimizar o uso de recursos no SNS é pecado capital porque... pois, já sabem, o público é que é bom!

Lembram-se também do pânico quando houve a privatização dos CTT? Curiosamente, semanas antes tinham vindo a lume vários casos em que carteiros tinham sido apanhados a roubar o conteúdo de cartas e encomendas ou as tinham muito simplesmente deitado ao lixo. Mas uns CTT privados seriam um perigo para a santidade da correspondência!

E terminemos com a TAP. Quando Passos Coelho falou em vender a parte que o Estado ainda tinha dessa transportadora, chamaram-lhe tudo e mais alguma coisa. Houve abaixo-assinados, ouvimos comentadores, jornalistas, políticos e muitos outros a berrarem que “o país precisa da TAP”. Estranhamente, nunca ouvi ninguém esclarecer porquê.

Essa venda iria ser feita numa altura propícia para um negócio desse tipo.

Bom, veio a geringonça e anunciou, com pompa e circunstância, que não só não iria vender o que o Estado ainda tinha, conseguira até negociar a compra da parte anteriormente vendida. É claro que proclamaram que tinha sido um ótimo negócio! E foi-o, para quem vendeu.

E agora, após centenas de milhões de euros de prejuízos e numa conjuntura altamente desfavorável, vêm os mesmos falar em vender. Concordo, claro, mais vale perder dinheiro de uma vez do que passar as próximas décadas com esse sorvedouro agarrado a nós. Mas duvido que se venha a concretizar, as forças da reação já estão a aguçar as facas e, muito francamente, quem quer uma companhia falida, endividada até à medula e cheia de pessoal habituado a fazer greves por tudo e por nada?

Muito francamente, devíamos era obrigar os do tal abaixo-assinado e os defensores acérrimos do “só o que é público é bom” a comprar a dita TAP e a mantê-la em funcionamento. Mas bem podemos esperar sentados, ou antes, deitados numa caminha confortável.

 

Para semana: O assédio sexual é sempre assédio? Mais um tema muito “na moda”, mas com enormes restrições...

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