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Luísa Opina

Neste blogue comentarei temas genéricos da nossa sociedade. Haverá um novo texto todas as sextas-feiras

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Luísa Opina

29
Mar24

129 - Inteligência artificial

Luísa

A inteligência artificial é o tema da moda, tratado, quase sempre, em tons catastróficos. Só que uma pequena pesquisa revela-nos que nada disso é novidade, nem a dita IA nem os temores que desperta.

A criação dos primeiros computadores levou a todo o tipo de especulações sobre o seu futuro e consequências para o bem-estar da humanidade ou, até, para a sua continuação. A existência de máquinas conscientes foi um dos temas favoritos da chamada época de ouro da Ficção Científica, nomeadamente com o Multivac de várias histórias de Isaac Asimov.

O grande filme “catastrófico” foi, sem dúvida, “Colossus, the Forbin Project”, um supercomputador criado para assegurar a paz. E, mais recentemente, quem pode esquecer os filmes Exterminador Implacável e o desastre que foi para a humanidade as máquinas tornarem-se conscientes?

O problema é que todos estes livros e filmes têm influenciado, e de que maneira, o modo como olhamos para o desenvolvimento da chamada inteligência artificial. Para mim, o grande problema está no nome, é que estes programas nada têm de inteligentes, fazem, isso sim, uso das enormes velocidades de computação atuais para consultarem inúmeras bases de dados e outro material a fim de obter uma resposta.

Curiosamente, está a evoluir de um modo bem diferente do que inicialmente se previa. Uma das primeiras utilizações seria a criação de robots que ajudassem pessoas tetraplégicas nas tarefas do dia-a-dia, dando-lhes, assim, uma maior independência. Só que... os problemas começaram logo a surgir. É que não lhes conseguiam “ensinar” coisas que qualquer criança aprende de um modo mais ou menos inconsciente.

Por exemplo, o que é uma mesa e o que é um banco. Acham estranho? Pensem um pouco, como definiriam estes termos, mesa e banco, de modo a uma máquina poder reconhecer logo esse objeto? Pois, não é tão linear como parece à primeira vista.

Isto levou ao chamado paradoxo de Moravec, nos anos 80, que diz, muito simplesmente, que algo que exige raciocínio e elevada capacidade cognitiva é mais fácil de implementar num computador do que algo que exija perceção e mobilidade. Ou seja, um robot com IA pode ser mestre de xadrez mas não consegue atar os atacadores de um sapato...

E isso está bem visível em muitas das suas aplicações. A tradução por máquina, por exemplo, que tanto apavora quem trabalha nessa área. Lido com ela, muito do trabalho que recebo consiste em controlo de qualidade de legendas traduzidas por um programa desses, e, muito francamente, é um desastre. Para começar, tudo quanto seja frase idiomática é traduzido à letra. Não é mantida a coerência, recentemente, “scooter” saiu como lambreta, scooter, moto e trotineta, tudo isto em pouco mais de 200 legendas! Pequeno detalhe, recebo o mesmo que teria se fizesse eu a tradução, até porque muitas vezes é mesmo o que acontece.

Passemos à escrita. Sim, também tenho contactos com programas de IA que escrevem por nós, segundo dizem. Só que ao fim de ler meia dúzia de resultados aprendemos logo a distinguir o que não teve mão humana. Sabem para que os uso? Se estou a escrever um livro de não ficção, pego no tema ou num subtema e peço um índice detalhado – isto permite-me ver se há algo que seria bom incluir, às vezes são, até, assuntos de que nem me tinha lembrado. E são bons para textos de rotina a enviar repetidamente – mesmo aqui, o ideal é usar o que o programa nos dá apenas como uma base a alterar a nosso gosto.

Passemos à arte. Também tenho alguma experiência, dois dos meus livros, Projeto para Portugal e Don’t sleepwalk through life, têm capas feitas com um programa de IA. Para um uso destes são úteis, mas para arte em si? Sim, criam imagens muito bonitas, mas, também aqui, parecem-se todas umas com as outras. E o que um perito consegue fazer com Photoshop bate-as aos pontos. Ou seja, a IA é ótima para nulidades em arte que querem fazer algo bonitinho.

Uma área em que a IA já é bastante útil é a dos serviços de atendimento. Mas, também aqui, “inteligência” é o termo errado, todos esses “assistentes virtuais” recebem à partida uma imensa base de dados de perguntas e respostas na área com que lidam, é mesmo uma lista exaustiva – sei-o porque também já traduzi e criei nessa área. Isto libertaria os assistentes de carne e osso para lidarem com questões não rotineiras.

O que me leva a uma outra área em que podia ser muito útil, a medicina. É que muitas das consultas que temos são rotineiras, assisti a várias com os meus pais e, francamente, se não fosse ser o único modo de poderem fazer análises e exames, eram uma pura perda de tempo. Com um programa bem ensinado, podíamos ter “consultas” muito mais frequentes sem sobrecarregar os médicos de família. Mais ainda, uma das características do programa seria, precisamente, detetar quando é preciso passar o caso a alguém humano.

Acham absurdo? Pois bem, um programa criado para responder a chamadas de emergência provou ser mais rápido a detetar casos de problemas cardíacos graves do que os humanos que atendiam essas chamadas.

Quanto à maior queixa, facilitar a desinformação, será que os jornalistas temem a concorrência? É que são ótimos a promovê-la, apesar de terem, apenas, uma inteligência humana... presume-se!

Finalmente, o medo das consequências desastrosas da IA para o emprego não passa da repetição do que ouvimos desde a primeira revolução industrial. Sim, há destruição de funções, mas há também a criação de novas, não nos esqueçamos de que a grande característica da evolução humana é a nossa capacidade de adaptação.

Só mais uma coisinha, experimente, muitos dos programas têm uma versão gratuita, pelo menos durante uns dias.

Para a semana: Os jovens são infelizes. É o que diz um estudo recente.

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